Raimundo Sirino

Agricultura de precisão
Quando o campo vira um laboratório de alta tecnologia. Sensores, satélites, robôs e toneladas de dados estão transformando a forma como produzimos alimentos. Bem-vindo à nova era da lavoura inteligente.

Uma revolução nas lavouras
No coração do Brasil, em uma imensa fazenda de soja no interior do Mato Grosso, um trator corta o campo com movimentos tão precisos quanto os de uma impressora 3D. O operador? Um software embarcado. A rota? Calculada por GPS com exatidão centimétrica. O destino? Um novo paradigma na produção de alimentos: a agricultura de precisão.
Quase imperceptível ao consumidor urbano, essa revolução tecnológica está remodelando o modo como cultivamos, adubamos, irrigamos e colhemos. Se antes a lavoura era comandada por intuição e experiência acumulada, hoje ela é monitorada por drones, analisada por algoritmos e guiada por satélites.
O que é agricultura de precisão, afinal?
Agricultura de precisão é o nome dado ao conjunto de tecnologias que permite tratar cada pedaço da lavoura como único. Em vez de aplicar fertilizante, água ou defensivo de forma uniforme, o agricultor faz isso apenas onde e quando é necessário – com base em mapas detalhados da área.
A definição oficial da Comissão Brasileira de Agricultura de Precisão é clara: trata-se de um “sistema de gerenciamento agrícola baseado na variabilidade espacial e temporal da unidade produtiva, visando ao aumento de retorno econômico e à redução do impacto ao ambiente”. Em outras palavras, é usar ciência para produzir mais, gastando menos e poluindo menos.
Como a tecnologia entra em campo
A base da Agricultura de Precisão são os dados. E para coletá-los, o campo está repleto de olhos e ouvidos eletrônicos. As estrelas desse sistema são:
• Satélites e GNSS (como o GPS): Localizam com exatidão cada ponto da lavoura.
• Sensores no solo e nas plantas: Medem umidade, nutrientes, biomassa, presença de pragas.
• Mapas de produtividade: Mostram quais áreas produzem mais ou menos, revelando padrões invisíveis a olho nu.
• Drones e imagens aéreas: Monitoram as culturas com câmeras multiespectrais.
• Máquinas inteligentes: Aplicam insumos com precisão cirúrgica, em tempo real ou conforme mapas pré-programados.
Um pouco de história (e de geopolítica)
O conceito de agricultura de precisão começou a germinar na década de 1980, com os primeiros mapas de produtividade gerados na Europa e nos EUA. Mas foi com o surgimento do GPS de uso civil, em 2000, que a ideia de “cultivar com exatidão” virou realidade acessível.
No Brasil, os primeiros passos foram tímidos, com importação de colhedoras com monitor de produtividade. Só a partir dos anos 2000 surgiram equipamentos nacionais e eventos científicos voltados à área, como o Simpósio Internacional de Agricultura de Precisão (SIAP) e o Congresso Brasileiro de Agricultura de Precisão (ConBAP). Em 2012, o tema ganhou status oficial com a criação da Comissão Brasileira de Agricultura de Precisão.
O solo não mente: por dentro da variabilidade
Uma lavoura não é homogênea. Mesmo em talhões aparentemente uniformes, existem diferenças no relevo, textura do solo, acúmulo de matéria orgânica e capacidade de retenção de água. Essas variações determinam como a planta vai crescer, responder à adubação ou resistir a pragas.
A Agricultura de Precisão permite mapear essa variabilidade com precisão. Usando amostragens georreferenciadas, sensores ou imagens de satélite, é possível identificar áreas mais férteis ou degradadas. O resultado: insumos aplicados sob medida, evitando desperdícios e ampliando o potencial produtivo.
Inteligência artificial no campo
Com o avanço da análise de dados, a agricultura entrou na era dos algoritmos. Sistemas de IA são capazes de prever o risco de doenças, calcular o momento ideal da colheita e recomendar doses personalizadas de fertilizantes com base em milhares de variáveis.
Softwares agrícolas fazem a leitura de mapas, integram dados climáticos, históricos da fazenda e comportamento da cultura. Tudo isso para uma tomada de decisão mais precisa e segura – às vezes em tempo real, durante a operação do maquinário.
Ganha o produtor. Ganha o planeta.
A agricultura de precisão não se resume a produtividade. Seus benefícios vão muito além do lucro no campo:
• Redução do uso de insumos: fertilizantes, herbicidas e água são aplicados apenas onde há real necessidade.
• Menor impacto ambiental: menos químicos nos solos e nos lençóis freáticos.
• Mais eficiência energética: tratores percorrem rotas otimizadas, economizando diesel.
• Sustentabilidade de longo prazo: o solo é manejado com mais cuidado e inteligência.
Na prática, trata-se de uma agricultura mais limpa, mais justa e mais viável para um mundo que precisa produzir mais com menos.
Desafios e futuro
Apesar de todo esse potencial, a Agricultura de Precisão ainda enfrenta entraves importantes:
• Custo inicial elevado, especialmente para pequenos produtores.
• Necessidade de capacitação técnica: o operador de máquinas precisa virar um analista de dados.
• Conectividade no campo, ainda precária em muitas regiões.
Mas o futuro promete avanços. Robôs agrícolas, sensores em sementes, colheitas seletivas por qualidade e monitoramento remoto por satélite em tempo real já estão em teste – e logo chegarão às fazendas.
Foto: https://br.freepik.com/ (2025)
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Raimundo Sirino Rodrigues Filho. Engenheiro Agrônomo, Pesquisador, Extensionista Rural e Professor Universitário. Graduado em Agronomia (UEMA); MSc. em Engenharia Agrícola – Irrigação e Drenagem (UFV) e DSc. em Agronomia – Solos e Nutrição de Plantas (UFPB).
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